sexta-feira, 20 de julho de 2012

Stuart Hall e o Pensamento Diaspórico



Stuart Hall é um pesquisador jamaicano, nascido em 1932 na cidade de Kingston. Filho mais jovem de uma família de classe média de ideais imperialistas e racistas. Hall adquiriu, desde jovem, consciência "da condição da cultura colonial, de como a gente sobrevive à experiência de dependencia colonial, de classe e cor, e de como isso pode destruir você, subjetivamente". Partindo de sua experiência pessoal o pesquisador desenvolve conceitos como os de identidade,  cultura e tradição na modernidade.  Foi diretor do Center for Contemporany Cultural Studies (CCS) da Universidade de Birmingham, na Inglaterra, nos anos 70. Sucessor de Raymond Williams no posto. Posteriormente, assumiu os Estudos Culturais como projeto institucional na Open University.
Para conhecer melhor esse pensador e as motivações de seu trabalho, sugiro a leitura da obra de onde extraio alguns conceitos básicos:
Da Diáspora: Identidades e Mediações Culturais. Trad. Adelaine La Guarda Resende. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2009.
Teoria X Ideologia

O pensamento tem um peso específico, pois o discurso teórico é uma prática cultural crítica, que se faz com a pretensão de intervir em uma discussão mais ampla; por natureza, a teoria tem esse potencial de intervenção. Quando revê a questão da ideologia Hall diz: “Também quero colocá-la ( a ideologia) enquanto problema geral – um problema para a teoria porque também é um problema para a política e a estratégia.”(PI).(p.13) A teoria é uma tentativa de solucionar problemas políticos e estratégicos; não uma elaboração a partir deles.A teoria é uma tentativa  de saber algo que, por sua vez, leva a um novo ponto de partida em um processo sempre inacabado de indagação e descoberta; não é um sistema que precisa ser acabado, útil na produção do conhecimento. (p.13-14)

Pensamento Diáspórico

A partir do conceito de nação imaginada de Benedict Anderson para quem as nações não são apenas entidades políticas soberanas, pois dentro delas articulam-se tensões entre o individual e o coletivo, Hall levanta as questões: “Essa questão é central, não apenas para seus povos, mas para as artes e culturas que produzem, onde um certo “sujeito imaginado” está sempre em jogo. Onde começam e onde terminam suas fronteiras, quando regionalmente cada uma é cultural e historicamente tão próxima de seus vizinhos e tantos vivem a milhares de quilômentros de casa? Como imaginar sua relação com a terra de origem, a natureza de seu “pertencimento” no Caribe à luz dessa experiência diaspórica?”(p.26)

Diáspora: termo que inicialmente refere-se à dispersão judaica devido à perseguição política e étnica. Utilizado por Hall para definir também a dispersão dos negros caribenhos, cuja metáfora de principal correspondência encontra-se no Velho Testamento, na libertação do povo judeu por Moisés

“Os entrevistados de Mary Chamberlain também falam eloquentemente da dificuldade sentida por muitos dos que retornam em se religar as suas sociedades de origem. Muitos sentem falta dos ritmos de vida cosmopolita com os quais tinham se aclimarado. Muitos sentem que a “terra” tornou-se irreconhecível. Em contrapartida, são vistos como se os elos naturais espontâneos que antes possuíam tivessem sido interrompidos por suas experiências diaspóricas. Sentem-se felizes por estar em casa. Mas a história, de alguma forma, interveio irrevogavelmente.”(p.26)

“Não podemos jamais ir para casa, voltar à cena primária enquanto momento esquecido de nossos começos e “autenticidade”, pois há sempre algo no meio. Não podemos retornar a uma unidade passada, pois só podemos conhecer o passado, a memória, o inconsciente através de seus efeitos, isto é, quando este é trazido para dentro da linguagem e de lá embarcamos numa (interminável) viagem. Diante da “floresta de signos” (Baudelaire), nos encontramos sempre na encruzilhada, com nossas histórias e memórias (“relíquias secularizadas”, como Benjamin, o colecionador, as descreve) ao mesmo tempo que esquadrinhamos a constelação cheia de tensão que se estende diante de nós, buscando a linguagem, o estilo, que vai dominar o movimento e dar-lhe forma. Talvez seja mais uma questão de buscar estar em casa aqui, no único momento e contexto que temos...”(p.27)

Identidade Cultural

Em uma concepção fechada de pátria, tribo e diáspora: “Possuir uma identidade cultural nesse sentido é estar primordialmente em contato com um núcleo imutável e atemporal, ligando ao passado o futuro e o presente numa linha ininterrupta. Esse cordão umbilical é o que chamamos de tradição, cujo teste é o de sua fidelidade às origens, sua presença consciente diante de si mesma, sua “autenticidade”. É claro, um mito – com todo o potencial real dos nossos mitos dominantes de moldar nossos imaginários, influenciar nossas ações, conferir significado às nossas vidas e dar sentido à nossa história.”(p.29)

PS: Conceito baseado sobre uma concepção binária de diferença, fundado sobre a construção de uma fronteira de exclusão  e depende da construção de um “outro” e de uma oposição rígida entre o dentro e o fora.

“...é importante ver essa perspectiva diaspórica da cultura como uma subversão dos modelos culturais tradicionais orientados para nação. Como outros processos globalizantes, a globalização cultural é desterritorializante em seus efeitos. Suas compreensões  espaço-temporais, impulsionadas pelas novas tecnologias, afrouxam os laços entre a cultura e o lugar. Disjunturas patentes de tempo e espaço são abruptamente convocadas, sem obliterar seus ritmos e tempos diferenciais. As culturas, é claro, têm “seus locais”. Porém, não é mais tão fácil dizer de onde elas se originam,”(p.36)  

Cultura e hibidismo

Sobre a realidade cultural no Caribe:

“A distinção de nossa cultura é manifestamente o resultado do maior entrelaçamento e fusão, na fornalha da sociedade colonial, de diferentes elementos culturais africanos, asiáticos e europeus (...) Esse resultado híbrido não pode mais ser facilmente desagregado em seus elementos “autênticos” de origem .”(p.31)

“Através da transculturação “grupos subordinados ou marginais selecionam e inventam a partir dos materiais a eles transmitidos pela cultura metropolitana dominante. É um processo da “zona de contato”, um termo que invoca a “copresença espacial e temporal dos sujeitos anteriormente isolados por disjunturas geográficas e históricas.””(.31)

Multicultural / Multiculturalismo

“Multicultural é um termo qualificativo. Descreve as características sociais e os problemas de governabilidade apresentados por qualquer sociedade na qual diferentes comunidades culturais convivem e tentam construir uma vida em comum, ao mesmo tempo em que retêm algo de sua identidade “original”.”(p.50)

“Multiculturalismo é substantivo. Refere-se às estratégias e políticas adotadas para governar ou administrar problemas de diversidade e multiplicidade gerados pelas sociedades multiculturais.”(p.50)

Raça e Etnia

O “termo raça é aplicado geralmente aos afro-caribenhos e etnicidade aos asiáticos. Considera-se que raça traduza melhor a experiência afro-caribenha por causa da importância da cor da pele, uma ideia derivada da biologia.(...) Os asiáticos não constituem uma raça, nem tampouco uma única etnia.”(p.66)

“Já a “etnicidade” gera um discurso em que a diferença se funda sob características culturais e religiosas. Nesses termos, ela frequentemente se contrapões a raça. Porém, essa oposição binária pode ser delineada de forma muito simplista.”(p.67)




2 comentários:

  1. Parabéns pelo blogue. Em meio a tanta superficialidade, um espaço de respeito e conhecimento.
    Eliane F.C.Lima (Blogue "Literatura em vida 2")

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  2. Eliane, muito obrigada pelo incentivo...

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